quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Kurt Cobain: A Lenda que não morreu! 13ª Parte



A BIBLIOTECA RICHARD NIXON

Olympia, Washington
Novembro de 1990 - Maio de 1991

"Pode estar na hora da Clinica Betty Ford ou da Biblioteca Richard
Nixon evitar que eu continue abusando de meu corpo anêmico tipo
rato."

De uma carta a Tobi Vail, maio de 1991.
"HEROINE", O ABASTARDAMENTO feito por Kurt da palavra
"Heroin", havia aparecido pela primeira vez em seus toscos cartuns da oitava
série. Tendo sido criado no fascínio pelo rock-and-roll, ele estava bem ciente
de que muitos músicos que idolatrava haviam sucumbido ao abuso de
drogas. E embora tivesse fumado maconha como um viciado,
freqüentemente bebesse demais e fosse conhecido por inalar gases de latas
de creme de barbear vazias, ele jurava que jamais sofreria um destino
similar. Em 1987, durante um dos períodos sóbrios de reabilitação de Kurt,
ele castigou Jesse reed quando este sugeriu que experimentassem heroína.
"Kurt não saiu mias comigo depois disso", lembra Jesse. "Eu
estava tentando encontrar heroína, uma droga que eu nem nunca havia
experimentado e ele também não, e ele me veio com um sermão: Por que
você quer se matar? Por que você tem tanta vontade de morrer?'." Em uma
história pessoal de drogas construída mais tarde na vida, Kurt escreveu que
ele primeiro havia usado heroína em Aberdeen no final dos anos 80. Seus
amigos contestaram isso, já que ele tinha medo de agulhas na época e não
era possível achar heroína em seu círculo. De vez em quando tomava
Percodan em Aberdeen, um narcótico vendido com receita: ele pode ter
romantizado e exagerado esse opiato quando o evocou mais tarde.
No outono de 1990, magoado por causa de Tobi, as mesmas
perguntas que Kurt fizera a Jesse anteriormente poderiam agora lhe ser
feita. no inicio de novembro, ele superou seu medo de agulhas e pela
primeira vez se injetou heroína com um amigo em Olympia. Descobriu que
os efeitos eufóricos da droga o ajudavam temporariamente a fugir de suas
dores de cabeça e de estômago.
No dia seguinte, Kurt ligou para Krist. "Ei, Krist, eu tomei heroína",
disse ele a seu amigo. "Uau! E como foi?", perguntou Krist. "Ah, foi tudo
bem", respondeu Kurt. Krist então lhe disse: "Você não devia fazer isto.
Lembre-se de Andy Wood". Wood era o vocalista do Mother Love Bone, uma
próspera banda de Seattle, que morreu de overdose de heroína e março de
1990.
Novoselic citou outros amigos de Olympia que haviam morrido pelo
vício com heroína. A resposta de Kurt foi: "É, eu sei". Novoselic,
desempenhando o papel de irmão mais velho, advertia Kurt de que a heroína
não era como as outras drogas que ele tomara: "Lembro de lhe ter dito
literalmente que ele estava brincando com dinamite".
O aviso, contudo, caiu em ouvidos surdos. Embora Kurt
prometesse a Krist que não tomaria a droga novamente, quebrou a
promessa. Para evitar que Krist ou Grohl descobrissem, Kurt tomava a droga
em casas de amigos. Descobriu um traficante chamado José, que estava
vendendo para muitos Greeners em Olympia.
Coincidentemente, Dylan Carlson havia experimentado heroína
pela primeira vez naquele outono, embora não com Kurt. Mas logo a ligação
entre os dois se estendeu a heroína — Normalmente tomada uma vez por
semana, graças a diversos fatores que incluíam sua pobreza e seu desejo de
não se tornarem viciados. Mas de vez em quando eles participavam de
farras, como da vez em que alugaram um quarto barato de Hotel em Seattle
para tomarem a droga reservadamente sem alarmar seus amigos ou colegas
de quarto.
Mas os amigos de Kurt estavam alarmados por seu uso de drogas.
Tracy havia finalmente perdoado Kurt e eles estavam se encontrando de vez
em quando. Quando Shelli contou a ela que Kurt estava tomando heroína,
ela não acreditou no que ouviu. Naquela semana, Kurt ligou para Tracy
tarde da noite, obviamente alto, e ela o questionou diretamente; "Ele me
disse que havia tomado algumas vezes.
Disse que realmente gostava e que a droga o deixava mais sociável.
Mas disse que não ia tomar o tempo todo. Tentei ser imparcial, dizendo-lhe
que ele não devia fazer isso, procurando não levá-lo a sentir-se mal por tê-la
tomado". Uma semana depois, eles passaram uma noite juntos,
comparecendo a várias festas. Entre os eventos, Kurt insistiu que parassem
em sua casa para que ele fosse ao banheiro. Como ele não voltava, Tracy foi
procurá-lo e o encontrou no chão, com uma garrafa de alvejante ao seu lado
e uma agulha no braço. Ela ficou furiosa:
Kurt havia se tornado algo que Tracy não poderia ter imaginado
mesmo em seu pior pesadelo.
A brincadeira do titulo do primeiro disco do Nirvana não parecia
engraçada para mais ninguém. Mas a heroína foi apenas uma pequena parte
de 1990 para Kurt e, na maior parte, ele manteve sua promessa de tomá-la
apenas ocasionalmente. Ele era distraído de tudo o mais pelo fato de que sua
carreira estava decolando como nunca antes. Assinou um contrato no
outono com a Virgin Publishing, que lhe rendeu seu primeiro grande cheque.
Kaz Utsunomiya, presidente da Virgin, voou para o noroeste para assinar o
contrato. Embora Kaz fosse um antigo veterano da industria e tivesse
trabalhado com todos, desde o Clash até o Queen, ficou chocado ao ver a
imundície do apartamento de Kurt. Conversaram sobre as influências que
Kurt teve, particularmente o Clash; Kurt disse que Sandinista! foi um dos
primeiros discos que ele teve que era remotamente Punk.
A cota inicial de Kurt no contrario de edição veio na forma de um
cheque de 3 mil dólares. Ele pagou o aluguel e depois foi de carro até o
Shopping South Sound com Mikey Nelson e Joe Preston. Kurt gastou quase
mil dólares na Toys "R" em um Nintendo, duas câmeras de vídeo Pixelvision,
duas armas Bb automática que pareciam rifles M16, e diversos modelos
plásticos de Evel Knievel. Comprou também fezes de cachorro falsa, vômito
falso e mãos decepadas de borracha. "Ele jogou aquilo tudo num cesto",
lembra Preston. "Era só um punhado de lixo que ele poderia destruir." Era
como se um garoto de oito anos tivesse sido solto na loja e lhe dissessem que
ele podia pegar tudo o que quisesse. Kurt usou a arma BB para
imediatamente atirar nas janelas do prédio da Loteria Estadual de
Washington do outro lado da rua. Comprou também, por vinte dólares, uma
bicicleta usada Swinger de criança, um estilo que na época era marcada
brega: ela era tão pequena que para pedalá-la ele tinha de se curvar com os
joelhos na altura de seus ombros.
Kurt andou alegremente na bicicleta até escurecer. Ele ainda
estava andando de bicicleta alguns dias depois, em meio aquela que na
época era a mais importante reunião de negócios de que ele já participara.
Por recomendação de Thurston Moore, a banda havia entrado em contato
com a Gold Mountain Management. A firma era dirigida por Danny Goldberg
e John Silva. Como gerente mais jovem, Silva recebera o encargo de negociar
com o Nirvana. Era uma tarefa fácil — por causa de sua ligação com o Sonic
Youth, ele já contava com a aprovação de Kurt. Silva e sua namorada, Lisa
Fancher, foram a Seattle para conhecer pessoalmente a banda e levá-los
para jantar. Kurt adorou ser levado para jantar por chefes da indústria
musical porque era o único jeito que ele tinha de garantir a si mesmo uma
refeição decente. Mas, nessa noite, silva e o resto da banda ficaram sentados
durante horas enquanto Kurt pedalava sua Swinger em círculos no
estacionamento da loteria. "Todos nós concluímos que ele ia quebrar o braço
ou a perna", lembra Fancher. Embora o longo atraso parecesse apenas mais
um passatempo infantil, um observador mais cínico poderia ter sugerido que
era o primeiro passo de Kurt no que se tornaria uma batalha de vontades
com seu futuro empresário.
Kurt deixou a bicicleta de lado para ir jantar, mas anunciou que o
Beat Happening estava tocando na cidade. Era um teste do interesse de silva
e, como todo bom executivo, Siva mostrou-se entusiasmado e foi para o
show com Kurt. Mais tarde, Silva protestou com Fancher que ele detestava a
banda de Calvin (Ela também lembra que ele inicialmente odiava o Sonic
Youth, queixando-se de seus "egos inflados"). No entanto, ele havia passado
no teste ácido de Kurt e, naquela semana, o Nirvana assinou um contrato
com a Gold Mountain.
No dia 25 de novembro, o Nirvana fez um show na Off-Ramp de
Seattle que atraiu mais representantes A&R do que qualquer outro concerto
na história do noroeste.
Representantes da Columbia, da Capitol, da Slash, da RCA e
diversas outras gravadoras estavam trombando entre si. "Os caras A&R
estavam fazendo marcação cerrada", observa Damon Stewart, da Sony. O
número elevado de representantes alterou o modo com a banda era
percebida em Seattle. "Naquela época", explica Susan Silver, "Havia um
frenesi competitivo ali para ver quem pegava qual banda." O show em si
mesmo foi excepcional — mais tarde Kurt disse a um amigo que essa foi sua
apresentação favorita do Nirvana. Durante um show com dezoito canções, a
banda tocou doze músicas inéditas. Abriram com a poderosa "Aneurysm",
pela primeira vez tocada em público, e a platéia entrou na slam-dance e no
surfe sem prancha até que quebraram as lâmpadas do teto. "Achei o show
espantoso", lembra Kim Thayil do Soundgarden. "Eles fizeram uma versão de
"Here she Come Now" do Velvet Underground que eu achei brilhante.
E depois, quando ouvi "Lithium", aquilo ficou na minha cabeça.
Bem, o nosso baixista veio a mim e disse; "Essa é sucesso. Ai está uma das
Top 40". Os A&R estavam igualmente impressionados. Quando o show
terminou — após uma pausa para um alarme de incêndio —, Jeff Fenster,
da Charisma Records, conseguiu convencer a banda de que sua gravadora
era a melhor opção. Dois dias depois, o advogado do Nirvana, Alan Mintz,
ligou e disse que a banda iria assinar com a Charisma. O contrato era de
200 mil dólares, um adiantamento sólido, mas não ultrajante. Mas antes que
Fenster tivesse um contrato preparado, a banda resolveu, na última hora,
assinar com a DGC, um selo da Geffen Records. Embora o representante
A&R da DGC, Gary gersh, não tivesse sido um dos primeiros a apresentar
propostas, o endosso do Sonic Youth em última instância se mostrou como
fator decisivo.
A Geffen também tinha um forte departamento de promoção,
liderado por Mark Kates, e a Gold Mountain sabia que a promoção era a
chave para lançar a banda. o contrato da geffen estipulava o pagamento de
287 mil dólares ao Nirvana, na época um dos maiores adiantamentos parfa
uma banda do noroeste.
Mints desemaranhou a banda dos resquícios do contrato com a
Sub Pop:
como parte do acordo da Geffen, a Sub Pop receberia 75 mil
dólares e ficaria com 2% das vendas dos próximos dois discos.
Embora Kurt tivesse lido livros sobre a industria musical, não
estava preparado para o longo tempo necessário para finalizar do contrato —
o contrato só foi assinado em abril — e para o pouco dinheiro que isso
significou inicialmente. No momento em que foram deduzidos os honorários
para advogados, empresários, impostos e diidas, a Gold Mountain atribuiu a
ele um honorário de mil dólares por mês. Ele imediatamente ficou com suas
contas atrasadas e se queixou de que só podia comer salsichas no espeto —
o cão do apartamento estava agora coalhado de varetas.
Grohl havia voltado ao leste para passar a maior parte do mês de
dezembro e, sem seu colega de apartamento, Kurt procurava aliviar o tédio
por todos os meios necessários. Ele saia muito com Dylan e ele rompeu
outra barreira que havia jurado jamais atravessar. Dylan era louco por
armas e Kurt sempre pregara que as armas eram pura barbárie. Algumas
vezes Kurt concordava em ir até o bosque com Dylan, mas não tocava na nas
armas e, certa vez, até se recusou a sair do carro. Ma, por fim, Kurt começou
a permitir que Dylan lhe mostrasse como mirar e disparar. Era uma coisa
inofensiva; fazer furos em latas com espingardas ou alvejar projetos de arte
que Kurt havia resolvido sacrificar.
Kurt começou também a sair bastante com Mikey Nelson para
fazer compras em brechós. "Sempre havia algum disco que ele estava
esperando encontrar", disse Nelson. "Um de seus favoritos tinha um bando
de caminhoneiros conversando pela "faixa do cidadão". Ele tinha o disco de
Charles Manson, Lie. E era um tremendo fâ de H.R. Pufntuf." Já no final de
1990, Kurt ainda estava exaltando os méritos de Get the knack do grupo
Knack. "Ele me disse que todas as músicas sensacionais desse disco eram
aquela sobre as quais as pessoas nunca tinham ouvido falar." John Purkey
visitou o apartamento naquele mês e ajudou Kurt a comprar presentes de
natal. A maior aquisição de Kurt naquele ano foi um enorme aquário sob
encomenda para suas tartarugas. Eles fumaram maconha antes das
compras, mas Purkey ficou surpreso quando Kurt perguntou: "Você sabe
onde eu posso conseguir heroína?". Purkey respondeu: "Você não está
tomando pico, está?". "Ah, não", mentiu Kurt. "Eu só vou fumar um pouco."
Em diversos sentidos, seu magro orçamento ajudava a controlar seus
desejos de viciado; ele simplesmente não podia se permitir torna-se um
viciado em drogas.
No dia 11 de dezembro, Kurt mais uma vez procurou ajuda médica
para seu problema de estômago, consultando um médico em Tacoma. Dessa
vez, o diagnóstico foi síndrome de intestino irritado e o médico lhe receitou
Lodox, uma forma de clidinium. O remédio não pareceu aliviar sua dor e ele
parou de tomá-lo duas semanas depois, quando ficou com bronquite.
O ano terminou com um show na véspera de Ano-Novo em
PortLand, no Satyricon. "Slim" viajou com a banda e viu o que ele lembra
como um show decisivo, apesar do fato de que Kurt estava embriagado de
uísque e Coca-Cola, contra as ordens de seu médico. Era perceptível agora
que Kurt estava atraindo tietes. "Slim" observo uma jovem com os olhos
pregados nele durante todo o show: "Seu comportamento dizia: "Eu sou a
garota da platéia que quer transar com você esta noite". Entretanto, Kurt
não notou e, como na maioria das noites, foi para casa sozinho.
O grupo começou o ano de 1991 saindo de Portland tarde da noite,
para um trajeto de três horas, já que eles tinham uma sessão de estúdio
marcada para o dia seguinte. Terminaram duas canções, "Aneurysm" e uma
regravação de "Even in His Youth". Também trabalharam diversas canções
que Kurt tinha acabado de compor, entre elas uma versão inicial de "All
Apologies".
"Eles tinham um punhado de idéia que desejavam lançar", lembra
Craig Montgomery, que produziu as faixas. "Mas o equipamento deles estava
em péssimo estado e eles estavam totalmente de porre." Jesse Reed, o amigo
de Kurt, regressara para o noroeste para o feriado e, no dia seguinte á
sessão de gravação, foram até Aberdeen para visitar os Pais de Jesse.
No trajeto, Kurt se viu falando sobre seu futuro com seu velho
amigo e, quando o carro entrava no perímetro de Grays Harbor, confessou
seu amor por essa paisagem e o povo do lugar, contradizendo tudo o que ele
dizia nas entrevistas. Enquanto passavam por algumas fazendas próximas a
Satsop — um vale bucólico, a despeito de uma usina nuclear abandonada-,
Kurt contou a Jesse que seu sonho era usar o adiantamento de sua
gravadora para comprar uma fazenda. Ele viu um enorme rancho e apontou
para ele: "O que você acha daquela casa lá em cima? Se eu comprar essa,
podemos tocar o mais alto que quisermos, fazer grandes festas, trazer muita
gente e ninguém vai se importar". A casa não estava á venda e Kurt ainda
não tinha dinheiro, mas ele jurou a Jesse que se algum dia fizesse sucesso,
ele voltaria para o ponto e compraria um rancho "igual ao que Neil Young
tem na Califórnia".
No inicio de 1991, Kurt deu um telefonema que ele vinha adiando
havia anos: ligou para o pai. Desde que se mudara para Olympia, a maior
parte de seu contato com Don havia se dado por intermédio de seus avós.
A conversa — como era típico da comunicação entre dois estóicos
Cobain — foi breve. Kurt falou principalmente sobre a banda, contando a
Don que ele havia assinado um contrato com uma gravadora importante:
Don não sabia ao certo o que isso queria dizer, mas quando perguntou a
Kurt se ele tinha bastante dinheiro, seu filho disse que sim. Kurt perguntou
sobre os outros filhos de Don e eles conversaram um pouco sobre o último
emprego dele, como investigador na Patrulha
Estadual de Washington. Kurt contou ao pai que vinha fazendo
muitas apresentações: Don disse que gostaria de ir vê-lo algum dia. A
conversa durou apenas alguns minutos e foi mais marcada por aquilo que os
dois não disseram do que pelo que disseram. Don não conseguiu falar sobre
a mágoa que sentia por seu primogênito ter se desgarrado, e Kurt não foi
capaz de falar sobre nenhuma das mágoas que sentia: nem do divórcio, nem
do novo casamento, nem dos seus muitos outros conflitos.
O contrato de Kurt com a mãe tinha continuado melhor: o
interesse dela pela sua carreira e a aceitação dele como músico parecia
aumentar á medida que sua fama crescia. Kurt e Wendy ainda se
aproximaram mais naquele ano, quando outra tragédia familiar se abateu no
dia 2 de janeiro de 1991 — Patrick irmão de Wendy, morreu de Aids na
Califórnia, aos 46 anos. O homossexualismo de Patrick sempre fora um
profundo segredo na família Fradenburg: ele era tão bonito e popular com as
garotas que seus pais pareciam incapazes de acreditar quando ele anunciou
que era Gay. Mesmo antes do diagnostico, ele sofrera de depressão clinica,
mas quando a Aids se tornou plenamente desenvolvida, entrou em parafuso
emocional. A raiva que sentia dos pais era tão grande que ele pretendia
escrever um tratado sobre sua história sexual — que incluía o fato de que ele
fora sexualmente molestado por seu tio Delbert — e enviá-lo ao Aberdeen
Daily World para embaraçar sua família. Nas condições em que aconteceu, a
família resolveu deixar a causa da morte fora do obituário e relacionar seu
parceiro doméstico como "um amigo especial". Kurt foi convidado para o
funeral mas não compareceu; alegou que precisava trabalhar no seu
próximo disco.
Dessa vez, Kurt não estava mentindo para sair fora de um
compromisso familiar.
Ele estava, de fato, preparando seu disco e, quando 1991 começou,
estava trabalhando meticulosamente. O Nirvana havia alugado um novo
espaço para ensaiar em Tacoma, e todo dia ensaiavam durante horas. Parte
dos ensaios era para ensinar a grohl as canções do catálogo, mas a maior
parte era para afiar o novo material que Kurt estava compondo. Em janeiro,
a Sub Pop lançou seu ultimo single oficial do Nirvana, uma gravação ao vivo
de "Molly's Lips", dos Vaselines. Na área final do vinil a gravadora havia
imprimido uma despedida lacônica: "Até".
Em fevereiro Kurt completou 24 anos e, para a ocasião, ele se
sentou e começou a escrever a história da sua vida, uma dentre dezenas de
curtas tentativas que empreendeu ao longo dos anos. Essa versão se
estendia por três páginas antes de esmorece. "Olá, estou com 24 anos",
escreveu ele. "Nasci Homem branco de classe média inferior da costa do
estado de Washington. Meus pais tinham um sistema de som estereofônico
compacto modelado em madeira artificial e um conjunto de quatro discos
contendo sucesso contemporâneos da rádio Am do inicio dos anos 70,
chamado Good Vibrations, de Ronco. Continha sucessos como "Tie a Yellow
Ribbon" de Tony e Dawn Orlando e Time in a bottle" de Jim Croce. Após
anos implorando, eles finalmente me compraram uma bateria de lata com
tampos de papel, encontrada na última capa de um catálogo da Sears. Na
primeira semana, minha irmã fez furos nos tampos com uma chave de
fenda."
A história de Kurt prosseguia para comentar que ele se lembrava
de sua mãe tocando canções do Chicago no piano e que ele seria
eternamente grato a sua tia Mari por lhe dar três discos dos Beatles. Ele
escreveu que uma de suas primeiras decepções foi quando descobriu, em
1976, que os Beatles haviam se separado seis anos antes. O divórcio de seus
pais parecia quase não ter efeito: "Meus pais se divorciaram e me mudei com
meu pai para um estacionamento de trailers em um comunidade madeireira
ainda menor. Os amigos de meu pai o convenceram a entrar para o
Columbia Records Club e logo os discos chegavam ao meu trailer uma vez
por semana, acumulando-se em um grande coleção". E com isso, esta
tentativa de contar a história de sua vida terminava. Ele voltou ao assunto
favorito de seu diário na época: escrever notas para o encarte do próximo
disco. Ele escreveu muitas versões diferentes — no final o disco não incluiu
nenhuma —, mas a versão de uma dedicatória para o disco dizia mais sobre
sua infância do que sua tentativa de biografia: "Obrigado aos pais
desencorajadores de toda parte", escreveu ele, "por darem a seus filhos a
vontade de se mostrar".
Em março, o Nirvana se apresentou quatro vezes em uma turnê
pelo Canadá e depois voltou imediatamente aos ensaios. Após muita
discussão com seus empresários e chefes da gravadora, acertaram em ter
Butch Vig novamente como produtor, usando o Sound City, um estúdio na
periferia de Los Angeles. A gravadora pagaria as despesas, embora elas
saíssem do adiantamento do Nirvana.
Antes de se dirigirem para a Califórnia, a banda tinha mais um
show em Seattle no dia 17 de abril, no hotel O.K. Kurt o organizou após ficar
sabendo que seu amigo Mikey Nelson tinha tantas multas de trânsito não
pagas que corria o risco de ir para a cadeia. O programa incluia Bikini Kill e
Fits of Depression, e Kurt insistiu que toda a renda fosse para Nelson. o
show não teve todos os seus ingressos vendidos graças a uma festa para o
filme Singles: Vida de Solteiro na mesma noite na mesma noite. O repertório
do Nirvana incluia covers de "Turnaround" do Devo, "Wild Thing" do Troggs,
e "D7" do Wipers, mas a surpresa viria quando a banda tocasse uma
composição nova. Kurt enrolou os vocais, talvez sem querer saber todas as
palavras, mas a parte da guitarra já estava pronta, assim como a tremenda
batida condutora da bateria. "Eu não sabia o que eles estavam tocando",
lembra Susie tennant, representante promocional da DGC, "Mas eu sabia
que era surpreendente. Lembro de ter ficado pulando e perguntando a todos
ao meu lado: "Que música é está?."
As palavras de Tennant faziam coro ao que Novoselic e Grohl
haviam dito três semanas antes, quando Kurt trouxe um novo tema para o
ensaio. "Chama-se "Smells Like teen Spirit", anunciou Kurt a seus parceiros
de banda, roubando o grafite de Kathleen Hanna. Na época, ninguém da
banda sabia do desodorante e só quando a canção foi gravada e masterizada
é que alguém observou que ela continha o nome de um produto. Quando
Kurt apresentou a canção pela primeira vez no estúdio, ela tinha uma batida
mais rápida e menos foco de transição. "Kurt estava tocando apenas o
estribilho", lembra Krist. foi idéia de Krist reduzir o andamento da melodia e
Grohl acrescentou intuitivamente uma batida forte.
No hotel O.K , Kurt apenas gemeu uns dois versos. Ele estava
mudando a letra de todas as suas musicas durante esse período e "teen
Spirit" teve cerca de uma dúzia de versões. Uma das primeiras versões trazia
o estribilho: "A denial and from strangers/ a revival and from favors/ here
we are now, we're so famous/
We're so stupid and from Vegas {Uma recusa e de estranhos/ Uma
reapresentação e de Vegas]". Outra começava com: "Come out and play.
make up the rules/ Have los of fun, we know we'll lose" [Venham e toquem,
façam as regras/Divirtam-se bastante, sabemos que perderemos]. Mais
adiante, na mesma versão, havia um verso que não encontrava rima em
outro:
"The finest day I ever had was when tomorrow never came" [O
melhor dia que já tive foi quando o amanhã não chegou].
Uma semana depois a banda se dirigia para Los Angeles. No
trajeto, Kurt parou na Universal Studios e foi fazer os mesmos passeios que
havia feito com seus avós quinze anos antes. O grupo se mudou para os
Oakwood Apartments para as próximas seis semanas, não muito longe do
Sound City Studios. Vig os visitou durante a pré-produção e encontrou caos.
"havia grafites nas paredes", lembra ele, "e os sofás estavam de pernas para
o ar. Ele ficavam acordados toda noite e iam para Venice Beach, onde
ficavam até ás seis da manhã." O Nervosismo que a banda sentia com a
gravação era aliviado pelo álcool, que os três tomavam em excesso.
Certa noite, Krist foi detido por dirigir embriagado: John Silva teve
de se empenhar muito para pagar sua fiança e trazê-lo de volta para o
estúdio. A maioria das sessões começavam ás três da tarde e iam até a meianoite,
Durante os intervalos, Kurt perambulava pelo estúdio e olhava
fixamente para os discos de outro de álbuns como Rumours do Fleetwood
Mac e Damn the Torpedoes do Tom Petty, embora ficasse mais tocado pelo
disco do Evel Knievel que estava lá. A banda lite-metal Warrant tinha
alugado o estúdio antes do nirvana: quando o grupo voltou para pegar os
instrumentos, Kurt usou o sistema de alto-falantes do estúdio para começar
a gritar "Bring me some "cherry Pie", titulo do sucesso da Warrant. Uma
noite, Kurt roubou as matrizes do álbum de Evel Knievel e as levou para sua
casa em Olympia.
Eles passaram a primeira semana tentando montar as faixas
básicas, concentrando-se especialmente nos sons da bateria, a especialidade
de Vig. Depois de duas semanas, eles tinham conseguido trabalhar em dez
músicas, apesar de a maioria delas ter apenas três takes porque a voz de
kurt poderia se desgastar após tanto esforço. Várias das musicas foram
aquelas gravadas nas sessões do Smart Studios, e lá o trabalho foi mais
técnico que criativo.
Em comparação com as outras sessões de gravação da banda,
tiveram alguns problemas. Durante a gravação de "Lithium, Kurt esforçou-se
para que suas partes de guitarra saíssem certas e foi ficando cada vez mais
frustrado, ás vezes julgando-a no chão do estúdio. No final, Vig decidiu usar
o take gravado durante o estado de fissão nuclear de Kurt - ele foi intitulado
"Endlees, Nameless" e posto no CD como uma faixa oculta.
O maior problema da sessão de gravação foi a procrastinação de
Kurt — ele ainda não tinha decidido a letra de várias das musicas, apesar de
algumas das melodias, como "Polly" e "Breed", estarem sendo tocadas pela
banda há anos. Quando ele terminou as letras, a maior parte delas era
paradoxal, assim como também reveladoras. Vários versos deixavam o
ouvinte incerto sobre se ele estava expressando circunstâncias externas ou
internas, o tom emocional da canção desafiando interpretações. No seus
diários, Kurt escreveu uma carta ao crítico Lester Bangs, morto há muito, se
queixando do jornalismo especializado — uma profissão que tanto o
fascinava quanto repugnava —, perguntando: "Por que nesse inferno os
jornalistas insistem em fazer uma segunda análise freudiana das minhas
letras, quando 90% do tempo eles as transcreveram incorretamente?".
Apesar do bom senso da pergunta de Kurt, ele passava horas
tentando analisar as músicas dos seus ídolos. Ele também aperfeiçoou suas
próprias composições, ora inserindo mensagens, ora editando ele mesmo
quando achava que tinha muito revelador. Esse foi o caso de "Something in
the Way", a última música gravada durante as sessões. As letras narravam o
periodo mítico de Kurt, aquele em que ele morava debaixo da ponte. Ele
tinha escrito essa canção um ano antes, mas havia deixado escondida dos
parceiros da banda. Em seu primeiro plano para o álbuns, Kurt queria um
lado "Girl" (composto de todas as músicas sobre Tobi) e o lado "Boy" (para
incluir "Sliver", "Sappy" e "Polly", entre outras — todas as músicas sobre sua
família ou sobre seu mundo interior). Ele sempre havia planejado terminar o
álbum com "Something in the Way", apesar de nunca o ter mencionado ao
produtor.
Em vez disso, ele apresentou a música durante as sessões de
gravação do Sound City como uma surpresa de último minuto, e escreveu a
letra no estúdio, tentando fazer parecer para trabalhar nela por anos. Apesar
de sua carta para Lester Bangs, nenhuma análise freudiana superaria a
própria análise de Kurt, e ele
sabia muito bem que fazer uma canção sobre ter namorado
embaixo da ponte causaria muito sofrimento a sua família.
Assim que terminaram as gravações, um amigo de Grohl apareceu
e ofereceu a aposta de que ele seria capa da Rolling Stone em seis meses.
Kurt respondeu: "Ah, esquece isso". Mikey Nelson e seus parceiros do Fitz of
Depression também apareceram e ficaram com o Nirvana no Oakwood, e
ainda os Melvins — durante uma semana havia 22 pessoas dormindo num
apartamento de dois quartos. O Fitz continuava sem sorte — um clube havia
se comprometido com um show e o tinha cancelado no último minuto. "Ligue
de volta para o Nelson", pediu Kurt, "e diga que ele vai tocar também." Dois
dias depois de terminar o disco, o Nirvana se apresentou num pequeno clube
de Los Angeles chamado Jabberjaw, e tocou pela primeira vez "On a Plain" e
"Come as You Are" para uma maravilhada platéia. Eles insistiram em que
toda a bilheteria ficaria com Nelson. Kurt descreveu o show numa carta para
Tobi como "Excesso de bebida e drogas, fora do tom, e o pior, malfeito. Levei
quinze minutos para trocar as cordas da minha guitarra, com as pessoas
gritando e me chamando de bêbado. Depois do show, corri para fora e
vomitei". No clube, Kurt viu Iggy Pop na platéia —, mas dessa vez, ele não
estava usando uma camiseta que pudesse embaraçá-lo. "Possivelmente foi o
momento mais agradável da minha vida", disse Kurt.
A parte mais reveladora de Kurt foi a carta em que admitiu estar
abusando cada vez mais das drogas, incluindo Kuaaludes, que ele ingeria
como confeitos. "Eu tenho tomado uma porção de drogas ultimamente", ele
escreveu a Tobi. "Pode estar na hora da Clinica Betty Ford ou da Biblioteca
Rochard Nixon evitar que eu continue abusando de meu corpo anêmico tipo
rato. Eu não posso esperar para voltar para casa (onde quer que isso seja),
na cama, neurótico e subnutrido, reclamando de como o tempo está ruim e
ser essa a razão da minha miséria. Sinto sua falta, Bikini Kill. Eu amo você,
copletamente." Ele assinou "Kurdt". Essa carta — como muitas outra que ele
escreveu — não foi enviada, talvez porque tenha conhecido outra mulher
duas semanas antes do show no Jabberjaw. Ela teria na vida dele um papel
muito maior que Betty Ford, Richard Nixon ou Tobi Vail.
Ele lembrou de uma pequena parte dela em Straight to Hell.

RAPE ME

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