terça-feira, 18 de outubro de 2011

Kurt Cobain: A Lenda que não morreu! 12ª Parte



TE AMO TANTO

Olympia, Washington
Maio de 1990 - Dezembro de 1990

"Love you so Much it Makes me Sick."
[Te amo tanto que fico enjoado.]
De "Aneurysm", 1990.

NA MESMA SEMANA EM QUE DEMITIU CHAD, Kurt rompeu com
Tracy. Também era uma espécie de demissão e ele lidava muito mal com
separações desse tipo. O decreto de Kurt para Tracy era que não deviam
morar juntos: ao dizer isto, contudo, ele não tinha nem dinheiro nem, em
sua letargia, capacidade para se mudar. E uma vez que Tracy gastava todo o
dinheiro para pagar as contas, também ela não tinha como se mudar.
Continuaram a dividir o apartamento até julho, quando ela encontrou um
novo lugar para morar em Tacoma. Durante esses três meses, eles viveram
em universos alternados, no mesmo espaço físico, mas separados por
quilômetros de distância emocional.
O mundo dele também era um mundo de traição, porque, embora
tivesse informado Tracy sobre sua infidelidade no Texas, Kurt deixara de
contar a ela a maior traição, a de que estava apaixonado por outra mulher.
O novo objeto de seus era Tobi Vail, uma musa de vinte anos de idade de
Olympia. Kurt conhecia Tobi havia dois anos, mas foi apenas no inicio de
1990 que ele teve a chance de passar uma noite inteira com ela. No dia
seguinte, contou a Dylan que encontrara a primeira mulher que o deixou tão
nervoso que ele vomitou. Kurt fala dessa experiência na canção "Aneurysm",
onde diz: "Te amo tanto que fico enjoado".
Embora ela fosse três anos mais nova, seu nível educacional era
mais alto que o dele, e ele ficava horas ouvindo Tobi e sua amiga Kathleen
Hanna tagarelando sobre sexismo e seus planos para fundar uma banda
chamada Bikini kill. Tobi tinha seu próprio fanzine e em suas páginas ela
havia cunhado a expressão "Riot Grrrl" para descrever o Modelo 1990 do
feminismo punk. Ela era basicamente baterista, mas sabia tocar guitarra:
tinha uma extensa coleção de discos punk Rock: e era, segundo Kurt
imaginava, sua contraparte feminina. "Você nunca encontra uma garota que
conheça tanto sobre música", observa "Slim" Moon. No entanto, a despeito
de seus interesse musicais comuns, Kurt se apaixonara por alguém que
jamais poderia amá-lo do jeito que Tracy o amara e que, o mais importante,
nunca precisava dele. Tobi tinha uma visão de relacionamento mais casual
do que Kurt: ela não estava procurando um marido, nem estava disposta a
ser mãe dele. "Namorados eram mais como acessórios da moda para Tobi",
observa Alice Wheeler. O que kurt estava procurando num relacionamento
era o tipo de intimidade familiar que lhe faltara desde a primeira infância,
mas Tobi, como sexista, rejeitava a relação tradicional que ele procurava.
Mesmo a palavra "namorada" significava uma coisa diferente na
comunidade Punk Rock de Olympia, onde poucos admitiriam fazer parte de
um casal. Era como se agir no sentido de um namoro firme fosse adotar os
padrões tradicionais de uma sociedade de que todos vinham para Olympia
para se livrar. "Ninguém namorava em Olympia", observa Dylan. Por esses
padrões, o relacionamento de Kurt e Tracy era totalmente antiquado; sua
união com Tobi não se conformaria a esses papéis estereotipados.
O relacionamento dos dois começara em sigilo — ele ainda estava
morando com Tracy quando dormiu com ela pela primeira vez. Mas, mesmo
depois que Tracy se mudou, o namoro não pareceu ir além das discussões
na cafeteria e o ocasional sexo tarde da noite. Ele pensava nela o tempo
todo, obsessivamente, e saia pouco, receando que ela pudesse ligar. Tobi
raramente ligava. A relação envolvia principalmente ir a concertos, trabalhar
no fanzine ou conversar sobre política.
Ele começou a interpretar as opiniões dela sobre o punk rock
através de sua própria lente, o que o inspirou a redigir listas de coisas nas
quais acreditava, coisas que ele odiava e discos que deveria ouvir. Um slogan
que ele repetia sempre era: "o punk rock é liberdade". passou a afirmar isto
enfaticamente em toda entrevista, embora nunca explicasse do que estava
procurando liberdade: isso tornou-se um mantra para resolver qualquer
contradição em sua vida. Tobi achou que soava sensacional.
No entanto, apesar da união intelectual, muitos em Olympia
jamais souberam que eles eram um casal. "O tempo todo ele rompeu com
Tracy porque, em certo sentido, isto a colocava no lugar. Eu não acho ela
realmente pretendia ficar com ele por muito tempo." Tobi, segundo kurt
descobriu, era alérgica a gatos e, por isso, sua fazenda de bichos
normalmente estava fora dos limites. A essa altura, também era uma sujeira:
quando Tracy saiu, o apartamento todo assumiu o aspecto de um depósito
de lixo, com pratos sujos empilhados, o chão forrado de roupas e as bonecas
mutiladas de Kurt vigiando o cenário com seus olhos enlouquecidos e
quebrados.
Um ano antes, Kurt se queixara de que as feministas lhe eram
ameaçadora. Mas depois que Kurt começou a dormir com Tobi, o feminismo
Riot Grrrl era mais fácil de engolir e ele logo aderiu a ele como se fosse uma
religião recém-descoberta. o mesmo homem que lia pornografia da Cicciolina
agora empregava palavras como "misoginia" e falava sobre a política de
opressão. Em seu caderno Kurt escreveu duas regras de rock que eram
citações de Tobi: "1- aprender a não tocar seu instrumento; 2- não machucar
as garotas quando você dançar (ou em nenhum outro momento)". O
"aprender a não tocar" era um dos muitos ensinamentos de Calvin Johnson,
que afirmava que a atividade musical era sempre secundária á emoção.
Kurt havia encontrado Tobi pela primeira vez ao tocar com o go
Team, uma banda de Olympia que girava em torno de Calvin, se bem que a
maior parte do cenário musical girava em torno de Calvin. Com seu cabelo
curto de menino e propensão a usar camisetas brancas, Johnson parecia um
recruta da Marinha desgarrado. Mas quando se tratava de punk Rock, ele
tinha o comportamento, se não a aparência, de um ditador, criando políticas
como um déspota recém-coroado elabora uma constituição. Ele era líder do
Beat Happening, co-proprietário da K Records, Dj na KAOS e promotor de
shows de rock locais. Ele pregava uma ética do rock independente, de baixa
fidelidade, e governava Olympia do jeito que buzz Osborne comandara Grays
Harbor. "Calvin era muito não-rock", lembra John Goodmanson." A piada
era que se você tinha um baixista em sua banda, você não podia estar na k."
os seguidores de Calvin tinham até um nome: "calvinistas". Tobi não era
apenas uma calvinista, ela já tinha sido namorada de Johnson.
Cada passo do relacionamento de kurt e Tobi apresentava desafios
a sua auto-estima. Era muito difícil para Kurt se encaixar no cenário
cosmopolita de Seattle, mas mesmo na minúscula Olympia ele se sentia
como se fosse um participante de uma versão punk Rock de Jeopardy!, em
que uma única resposta errada o mandaria de volta a Aberdeen. Para um
garoto que cresceu vestindo camisetas do Sammy Hagar, ele descobriu que
tinha de usar constantemente seu eu "kurdt" como disfarce para proteger
seu passado real. Ele chegava a confessar em um raro momento de autorevelação
em seu diário: "Tudo que eu faço é uma tentativa abertamente
consciente e neurótica de provar aos outros que sou pelo menos mais
inteligente e legal do que eles pensam". Quando lhe pediram para nomear
que influências tinha tido durante entrevistas á imprensa em 1990, ele fez
uma lista de músicas inteiramente diferente da que havia feito um ano
antes: passara a compreender que no mundo elitista do punk rock, quanto
mais obscura e impopular fosse uma banda, mais avançado era declinar o
nome dela. Os amigos começaram a notar mais o eu dividido: quando estava
junto de tobi, Kurt podia criticar uma banda que, mais cedo, no mesmo dia,
ele defendera.
Naquele verão, tanto Krist como Kurt estavam fastidiosamente
reproduzindo fitas das demos do Smart Studios, mas não estavam gastando
selos enviando-as á Toch and go; eles as enviavam para a Columbia Records
e para a Warner Brothers.
Depois de todos os problemas com a Sub Pop, Kurt e Krist haviam
se empenhada em assinar com uma gravadora maior, no mínimo para
conseguir uma distribuição decente. Para Tobi, isto era um anátema.
Ela proclamava que sua banda jamais estaria numa grande
gravadora. Influenciado pela posição de Tobi, Kurt moderou suas aspirações
de uma grande gravadora dizendo aos entrevistadores que o Nirvana
assinaria com uma grande, receberia o cheque do adiantamento, rescindiria
e depois lançaria um disco pela K. Era uma fantasia magnificente, assim
como as muitas idéias grandiosas que flutuavam por sua cabeça, mas ele
não tinha nenhuma intenção de agir de modo tão tolo que ameaçasse sua
chance de fama e fortuna.
Desde a breve contratação de Tam Orhmund, o Nirvana havia
empresariado a si mesmo usando Michelle vlasimsky como contato, com
Krist controlando a maioria dos arranjos financeiros. "Eu era o único
membro do nirvana que tinha diploma do colegial", explica Krist. Em maio
de 1990, a Sub Pop enviou para a banda uma nova proposta de contrato -
tinha trinta páginas e concedia diversos direitos inequívocos á gravadora.
Kurt sabia que não queria assinar o documento. Ele e Krist recorreram a
Susan Silver, a respeitada empresária do Soundgarden. Ela deu uma olhada
no contrato e disse que eles precisavam de um advogado.
Silver ficou surpresa como eles estavam inflexíveis em não querer
estar mais na Sub Pop. Eles se queixavam de que Bleach não havia recebido
promoção nenhuma e de que a gravadora jamais lhe prestara contas de
quantas cópias haviam sido vendidas. Kurt declarou que desejava um
contrato de grande escala com uma gravadora importante, com a autoridade
de uma grande empresa respaldando-o, muito embora a banda ainda
estivesse sem baterista. Semelhante afirmação seria motivo para
enforcamento público no tribunal de Calvin, mas contrastava com a maioria
da bandas de Seattle. Ela também contradizia o que Kurt havia dito á
imprensa apenas três semanas antes. No dia 27 de abril, quando a emissora
de rádio WOZQ lhe perguntou se a banda consideraria assinar com uma
grande gravadora, ele replicou: "Não temos nenhum interesse numa grande
gravadora. Seria ótimo ter uma distribuição melhor, mas tudo o mais que
acompanha as grandes gravadoras é apenas um monte de besteira." No
entanto, no período transcorrido após essa entrevista, sua separação de
Tracy o havia privado de sua benfeitoria. Ele agora declarava que desejava
um "contrato de um milhão de dólares", mas, talvez numa aceitação da
influência de Tobi, ele proclamou que, mesmo quando o Nirvana conseguisse
seu contrato gigante, eles "ainda excursionariam numa Van", Kurt havia
ouvido falar de Peter Paterno, um dos advogados mais sérios do ramo, e
perguntou a Susan se ela poderia recomendá-los a ele. "Estou viajando para
Los Angeles amanhã", disse ela. "Se vocês aparecerem enquanto eu estiver
lá, levo vocês para conhecê-lo." Krist respondeu: "Partiremos de carro hoje á
noite e vemos você em dois dias".
Dois dias depois, encontraram Susan em Los Angeles. Elas os
apresentou a Don Muller, um famoso procurador, e quando Paterno não foi
capaz de arranjar tempo em sua agenda, ela os colocou em contato com o
advogado Alan Mintz. Este os achou "ingênuos, porém ambiciosos". A
especialidade de Mintz era bandas novas, mas descobriu que, mesmo como
artista novos, "eles estavam definitivamente entre os mais desmazelados que
já passaram pela porta".
A Sub Pop também estava conversando com advogados,
procurando utilizar a crescente reputação do Nirvana para conseguir que
uma gravadora importante investisse neles. Mintz mencionou isto para a
banda, sugerindo que eles poderiam obter a distribuição que desejavam na
Sub Pop. Kurt se inclinou para a frente e replicou com decisão: "Me tira
dessa gravadora!". Declarou ainda que desejava vender muitos discos.
Impressionado com a fita deles, Mintz começou a trabalhar para encontrar
um contrato para eles naquele mesmo dia.
Não foi uma tarefa difícil. Já em meados de 1990, a posição do
Nirvana como espetáculo dinâmico ao vivo, e o sucesso florescente de Bleach
na rádio universitária, tinham despertado o interesse de agentes de "artistas
e repertórios (A&R)", funcionários contratados por gravadoras para contratar
bandas.
O primeiro agente A&R interessado foi Bret Hartman, da Mca, que
no inicio de 1990 havia realizado discussões sobre o contrato da banda com
Poneman e Pavitt. Hartman percebeu que seu interesse não estava sendo
passado para a banda, por isso, conseguiu o telefone da casa de Kurt e
começou a deixar recados na secretária eletrônica.
Quando regressaram de Los Angeles para Seattle, Krist e Kurt
voltaram para o estúdio no dia 11 de julho para gravar o single "Sliver", a ser
lançado em antecipação a outra excursão pelo Reino Unido. Eles haviam
contratado Dan Peters, baterista do Mudhoney, para a gravação, embora
ainda estivessem testando bateristas. Esta seria sua ultima sessão de
estúdio malfeita, gravada enquanto a banda Tad estava numa pausa para o
Jantar. O titulo era mais uma composição de Cobain sem nenhuma relação
com a letra, mas, dessa vez, o nome era a única coisa vaga na canção: ela
era direta e um feito criativo. Para o tema, Kurt havia garimpado o que ele
conhecia melhor — sua família. Como Richard Pryor, que enfrentara
dificuldades em sua carreira de comediante até que começou a contar piadas
sobre ter sido criado num prostíbulo, Kurt havia finalmente descoberto sua
expressão única, que evoluía quando ele escrevia sobre sua família. Ele
havia encontrado seu dom de compositor, quase por acidente.
"Sliver" conta a história de um rapaz abandonado pelos pais e que
não quer ser deixado co os avós. Ele implora para que sua avó o leve para
casa, mas em vão.
Ele come purê de batatas no jantar. Tem problemas para digerir a
carne. Monta em sua moto e dá uma topada com o dedão do pé. Tenta
assistir á televisão, mas cai no sono. "Vovó, me leva para casa/Eu quero
ficar sozinho", era o estribilho singelo. A canção termina quando o menino
acorda nos braços de sua mãe.
"Provavelmente é a canção mais direta que já gravamos", explicou
Kurt a Melody Maker. Também foi uma das primeiras canções do Nirvana a
utilizar dinâmica contrastante, que se tornaria marca registrada da banda;
os versos eram tranqüilos e lentos, mas o estribilho surgia numa parede
trovejante de sons.
Após seu lançamento, Kurt foi indagado sobre seu significado e
teve a audácia de afirmar que ela não era autobiográfica. Mas ninguém,
certamente não alguém que o conhecesse, acreditou nisso: "Era sobre ser
um garotinho e desejar estar em casa com a mamãe, sem querer ser pajeado
pelos avós", explica sua irmã Kim.
Em agosto, o Nirvana foi para a estrada para uma breve turnê pela
Costa Oeste, fazendo o show de abertura para o Sonic Youth e tendo Dale
Crover como baterista temporário. A excursão foi uma chance para Kurt
conhecer Thurston Moore e Kim Gordon, do Sonic Youth, a quem
considerava quase como reis. Sua auto-estima melhorou quando descobriu
que eles o tratavam como igual. As duas bandas imediatamente se tornaram
amigas e, o melhor de tudo, Moore e Gordon ofereceram um conselho
empresarial, sugerindo que o Nirvana considerasse a empresa que geria seus
negócios, a Gold Mountain.
Certamente eles precisavam de ajuda. A despeito da fama que a
excursão proporcionava, eram muito mal pagos, seguindo atrás do enorme
ônibus do Sonic Youth em sua absurda e pequena van Dodge, parecendo
mais fãs atrás de astros do que astros eles mesmos. No show de los Angeles,
Bret Hartman da MCA e seu chefe Paul Atkinson foram aos bastidores visitar
a banda após a apresentação e encontraram Kurt e Krist juntando os
equipamentos - eles eram pobres demais para pagar ajudantes da excursão.
Atkinson convidou a banda para visitar a MCA, mas Krist disse que tinha de
voltar por causa do seu emprego. A conversa foi interrompida quando Krist
explicou que tinha de vender camiseta — eles precisavam do dinheiro da
gasolina para sair da cidade.
Quando a excursão chegou ao noroeste, o interesse pelos rapazes
da cidade era maior do que pelo Sonic Youth. Em portland e Seattle, eles
eram astros prosperando: após cada show, um número crescente de fãs os
elogiava. No entanto, a personalidade de Kurt não parecia mudar com a
atenção, Observa Sally Barry, que estava em uma banda de abertura nessa
excursão. "Ele foi a primeira pessoa que vi se enfiando na multidão com sua
guitarra sem dar a mínima", lembra ela.
"Em outras pessoas, você podia notar pensamento consciente
disso. Mas, com Kurt, isso era instantâneo e Honesto." Quase todo show
terminava com Kurt saltando para a platéia ou com a platéia saltando sobre
ele. Nessa excursão, Kurt poupou seu baterista, já que Crover anunciara que
daria uma surra em Kurt e o deixaria em risco de vida se sua bateria fosse
danificada.
Crover tinha de regressar para os Melvins e o Nirvana contratou
Dan Peters como seu novo baterista e começou a planejar uma excursão pelo
Reino Unido. Mas, quando Peters fez a percussão para a num concerto no
dia 22 de setembro, na platéia estava outro candidato que Kurt e Krist
haviam chamado para teste. A apresentação, na qual Peters tocara bem, foi
seu primeiro e único show com o Nirvana.
O baterista recém-chegado era Dave Grohl, de 21 anos de idade.
Procedente da Virginia, Grohl havia tocado com as bandas Scream e Dain
Bramage. O trocadilho deste último nome provavelmente foi o bastante para
ele cair nas boas graças de Kurt, já que isso evidenciava, no mínimo, que
Grohl tinha o mesmo senso de humor que ele, Foi Buzz quem havia colocado
Grohl em contato com o Nirvana, voltando ao seu papel de mentor, e este
pode ter sido o melhor presente que receberam dele. no instante em que
Kurt e Krist ensaiaram com Grohl, souberam que tinham seu baterista final.
Apenas vinte dias depois, Dave Grohl estava tocando em seu
primeiro show com o Nirvana, mal sabendo os títulos das canções, muito
menos as partes da bateria.
Mas com Grohl isto quase não importava: como Krist e Kurt
descobriam, ele era um animal atrás da bateria. Kurt sofrera com bateristas
no passado, decorrendo seu perfeccionismo do próprio domínio do
Instrumento. Muitas vezes, quando passavam o som, Kurt ia regularmente
para a bateria e tocava algumas canções para checar o retorno. Mas Grohl
era o tipo de baterista que deixava Kurt contente por ter escolhido a
guitarra.
O primeiro show de Grohl foi no clube North Shore Surf de
Olympia. A noite marcou umas uma das piores confusões técnicas de toda a
história do Nirvana — um defeito na parte elétrica fez a energia cair diversas
vezes, e a banda teve de desligar metade de seus amplificadores para evitar
outros Blackouts. A única iluminação disponível vinha de lanternas na
platéia, criando um efeito sinistro como alguma coisa saída de um file
independente barato. Com uma bateria minúscula, Grohl se mostrou muito
forte: ele tocava os tambores com tanta força que destruiu as cordas de
ressonância.
Uma semana depois, a banda excursionava pela Inglaterra para
promover o single "Sliver" que, como de costume, só saiu quando a excursão
estava encerrada. No entanto, eles tocaram para platéias apaixonadas, sendo
sua fama na Inglaterra, na época, muito maior do que seus grupos favoritos.
No dia seguinte, ligou para o empresário dos Pixies, Ken Goes, e perguntou
se ele poderia ser empresário do Nirvana. Goes não conhecia Kurt, mas
concordou em marcar um encontro.
Quando se encontraram no sagão de um hotel, Goes descobriu que
Kurt estava mais interessado em conversar sobre os Pixies do que em mover
seu próprio grupo. "Ele não era o fã mediano, como o tipo que sempre vemos
ao lado das portas do palco", lembra Goes. "De fato, ele não era bem um fã,
ele era um estudioso da banda. Obviamente, tinha um enorme respeito por
aquilo que eles estavam fazendo. Ele ficou falando muito tempo a respeito"
Durante a conversa, surgiu um tumulto quando Charles Thompson, o
vocalista dos Pixies, entrou no hotel. Goes se ofereceu para apresentar Kurt
a seu ídolo, mas Kurt congelou diante da sugestão.
"Acho que não" disse Kurt, recuando ligeiramente. "Eu, hã, não
posso". E com isso Kurt bateu em retirada, procedendo como se nem fosse
digno de estar na presença de tamanho talento. Quando o Nirvana voltou da
Inglaterra, Dave Grohl decidiu mudar-se para o apartamento da rua Pear —
ele vinha se hospedando com Krist e Shelli.
Naquela mesma semana, a MCA enviou passagens de avião para
Kurt e Krist irem a Los Angeles conhecer os escritórios. A gravadora não era
a primeira escolha da banda — fazia muito tempo que a MCA tivera um
sucesso, as pessoas brincavam que as iniciais da empresa significavam
Music Cemetery America [Cemitério Americano da Musica] —, mas eles não
podiam recusar passagens gratuitas. A gravadora os hospedou no Hotel
Sheraton Universal e, depois que chegaram, Bret Hartman foi perguntar a
eles se as acomodações eram satisfatórias. Ele encontrou o frigobar
entreaberto e Kurt e Krist sentados no chão cercados por garrafinhas de
bebida.
"Quem pôs essa coisa no nosso quarto?", perguntou Kurt. A
despeito do fato de que a banda havia excursionado cinco vezes pelo Estados
Unidos e duas vezes pela Europa, Kurt jamais havia visto um frigobar.
Quando Harman explicou que ele poderia pegar o que quisesse na geladeira
e que a MCA pagaria, Kurt olhou para ele, incrédulo. "Percebi", lembra
Hartman, "que esses caras talvez não fossem tão experientes quanto eu
imaginava."
Eles não conheciam frigobares, mas sabiam que estava sendo
menosprezados no dia seguinte quando visitaram a MCA Hartman e
Atkinson tinham feito circular cópias de Bleach, acompanhadas de um
memorando insistindo para que o pessoal fosse afetuoso e gentil. No
entanto, quando escoltaram a banda pelo prédio, parecia que todos os
mandachuvas estavam em horário de almoço. Angee Jenkins, que gerenciava
o departamento de publicidade, falou com eles rapidamente e os encorajou,
tal como os rapazes da correspondência, que se incluíam entre o punhado de
empregados da MCA que havia ouvido Bleach. O cúmulo foi quando o grupo
foi conduzido ao escritório de Richard Palmese, que lhes deu um breve
aperto de mãos antes de murmurar: "´R realmente sensacional conhecer
vocês, rapazes. Eu gosto muito de sua música, mas tenho um compromisso
de almoço em cinco minutos. Vou ter de pedir licença". Kurt nem mesmo
sabia quem ele estava conhecendo, por isso virou-se para Atkinson e
perguntou: "Quem é aquele sujeito?". "Aquele é o presidente da MCA",
respondeu atKinson com uma careta. E, com isso, a MCA estava fora do
páreo. De volta a Los Angeles, Kurt e Krist entraram em contato com o Sonic
Youth, que novamente insistiu na Gold Mountain Management e lhe disse
que eles deviam assinar contrato com a gravadora deles, a DGC, que fazia
parte da Geffen Record, uma das poucas gravadoras que até então não
haviam manifestado interesse.
No momento em que Kurt voltou ao noroeste, Grohl havia se
mudado para sua casa e sua presença melhorou temporariamente o humor
de Kurt.
Morar sozinho nunca foi bom para a saúde mental de Kurt, e seu
isolamento atingiu um pico durante o verão de 1990. Ele carregava todos os
sinais de uma criança que havia sofrido um trauma grave: parava de
conversar exceto quando falava com ele, e diariamente passava horas sem
fazer nada além de alisar uma mecha de barba, olhando fixo para o vazio.
Ele e Tobi não estavam se vendo muito e, quando se encontravam, ele
parecia incapaz de avançar a relação para o próximo nível. Amargurado, ele
observava em seu diário: "A única diferença entre 'amigos que transam de
vez em quando' e 'namorados/namorada' são os títulos oficiais dados".
Quando Grohl foi morar com ele, as coisas melhoraram
provisoriamente — ele era tão extrovertido quanto Kurt era retraído. "A
casa", lembra Nikki McClure, "tornou-se a meninolândia. Agora Kurt tinha
alguém com quem vadiar o tempo todo. Havia ali uma certa coisa de marido
e mulher." Uma vez que Kurt era praticamente incapaz de arrumar coisa
alguma, Grohl fazia coisa do tipo lavar as roupas de Kurt para ele. Poucos
teriam conseguido lidar com o estado do apartamento, mas Grohl havia
passado os últimos anos na estrada. "Dave foi criado por lobos numa van",
explica Jennifer Finch. Ele ensinou Kurt a fazer tatuagens caseiras usando
uma agulha e um pouco de nanquim. Kurt decidiu marcar seu braço com o
logotipo da K Records — um "k" dentro de um escudo. Sendo novato, Kurt
teve de se espetar várias vezes com uma agulha e despejar a tinta na ferida.
A tatuagem foi ainda outra tentativa para impressionar Tobi — e
Calvin. A tatuagem declarando seu amor pelos Vaselines. Curiosamente, os
Vaselines não eram da K, embora seus discos fossem distribuídos pelo selo.
"Quem sabe o que ele estava pensando com aquela tatuagem com os dizeres:
'k Distribution'."
Uma idéia melhor teria sido traçar "Vaselines" em seu braço. Desde
que Kurt adicionou a música "molly's Lips" ao repertório do Nirvana, ele
vinha elogiando o grupo. Era a banda perfeita para Kurt Eram infantis,
amadores e desconhecidos fora do Reino unido e de uma pequena seita nos
Estados Unidos. Logo depois de ouvir os Vaselines, Kurt iniciou uma de suas
muitas campanhas de redação de múltiplos rascunhos de carta em seu
diário, tentando fazer amizade com Eugene Kelly, membro da banda. Essa
cartas eram sempre prolixas (em uma delas, Kurt mencionava seu "ridículo
horário de dormir, no qual me recolho nas primeiras horas da manhã e evito
com sucesso qualquer traço de luz do dia") e invariavelmente terminavam
com alguns comentário elogioso sobre o quanto os Vaselines eram
brilhantes: "Sem tentar ser embaraçosamente inexperiente, devo dizer que as
canções que você e Frances compuseram estão entre as mais belas já
compostas".
Grohl tinha o mesmo gosto musical de Kurt, mas não sua obsessão
em procurar o favor das lendas. Ele estava muito mais interessado em
garotas e elas estavam interessadas nele. Começou a namorar kathleen
Hanna, do Bikini Kill — Dave e Kurt praticavam então a versão de Olympia
do namoro duplo com Kathleen e Tobi: bebiam cerveja e elaboravam listas
dos discos mais importantes de punk rock. A maioria das diversões de Dave
e Kurt era adolescente, mas com Tobi e Kathleen por perto, ambos eram
mais sociáveis.
A situação tornou Kurt mais atraente para Tobi, já que a
perspectiva de sair como uma gangue era menos séria do que os encontros
individais. "Tobi e Kathleen chegavam a dizer literalmente: Vamos sair com o
Nirvana", lembra o vizinho Ian Dickson. Durante certa turbulenta de festa
na casa de Kurt, Kathleen pintou com spray na parede do quarto: "Kurt
smells like teen Spirit" ["Kurt tem cheiro de espírito adolescente"]. Ela estava
se referindo a um desodorante para garotas adolescentes e, por isso, seu
grafite não deixava de ter implicações: Tobi usava Teen Spirit e, ao escrever
isto na parede, kathleen estava zombando de Kurt por dormir com Tobi,
sugerindo que ele estava marcado pelo seu cheiro, no entanto, apesar de
uma noite ocasional de folias, Kurt estava solitário e desencantado — passou
algumas noites observando secretamente da rua a janela de Tobi, como um
tímido Cyrano. Pela primeira vez em anos, ele estava se sentindo menos
esperançoso em relação a sua carreira ainda, ainda que as gravadoras os
continuassem chamando. Estranhamente, após anos de expectativa, quando
se aproximou de fato o momento de assinar um contrato, ficou cheio de
insegurança.
Ele sentia falta da intimidade que tinha com Tracy e de seus
amigos. Poucas semanas depois de tracy ter se mudado, Kurt havia
finalmente confessado que vinha dormindo o tempo todo com Tobi e Tracy
ficou furiosa. "Se você mentiu sobre iso, você mentiria sobre qualquer coisa",
gritou Tracy, e uma parte dele acreditava nela.
Por muito pouco tempo, ele considerou comprar uma casa em
Olympia. Na verdade, ele não poderia concretizar nenhum tipo de compra
até que recebesse um cheque de adiantamento, mas estava tão confiante de
que conseguiria um grande contrato que pagou para obter uma lista de
imóveis disponível. Andou de carro com seu amigo Mikey Nelson, do Fitz of
Depression, examinando edifícios comerciais dilapidados, planejando
construir um estúdio de gravação na frente e morar nos fundos."Ele parecia
estar interessado apenas nas casas que pareciam empresas", disse Nelson.
"Ele não queria morar numa casa normal." Mas essa idéia, e todas as outras
fantasias que ele fazia para o futuro, voaram pela janela durante a primeira
semana de novembro, quando Tobi rompeu com ele.
Ele ficou arrasado: quando ela lhe deu a noticia, mal conseguiu
ficar em pé. Nunca havia levado um fora de namorada e sentiu-se péssimo
com aquilo. Ele e Tobi haviam saído durante menos de seis meses. Tinham
sido encontros casuais, sexo casual e namoro casual, mas o tempo todo ele
esperava que uma intimidade mais profunda estivesse se aproximando. Ele
regrediu ao velho padrão de internalizar seu abandono e seu autodesprezo.
Tobi não o deixara porque ela era jovem, e sim, segundo Kurt imaginou,
porque ele não a merecia. Ele ficou tão nauseado que, uma semana depois,
ajudando "Slim" a fazer sua mudança, ele teve de parar o carro para vomitar.
Na esteira do rompimento, Kurt se tornou mais taciturno do que
nunca. Encheu um caderno inteiro com disparates que lhe passavam pela
cabeça, muitos deles violentos e angustiados. Ele usava a escrita, a música e
a arte para expressar seu desespero, e com sua dor compunha canções.
Algumas delas eram canções loucas e iradas, mas representavam ainda
outro nível de sua arte, já que a raiva não era mais clichê e agora tinha uma
autenticidade que faltava a seu trabalho anterior. Essas novas canções eram
cheias de remorso, súplica, raiva e extremo desespero. Nos quatro meses que
se seguiram ao rompimento, Kurt escreveu meia dúzia de suas canções mais
memoráveis, todas elas sobre Tobi Vail.
A primeira foi "Aneurysm", que compôs na esperança de
reconquistá-la. Mas logo desistiu e preferiu usar as canções, como inúmeros
compositores haviam feito antes, para expressar seu nível profundo de
mágoa. Uma canção era chamada "Formula", mas acabou sendo rebatizada
de "Drain You". "One baby to another said, I'm lucky to have met you'" ["Um
bebê disse ao outro: 'Tenho sorte de ter te encontrado']", dizia a letra, citando
palavras que Tobi lhe avia dito. "It is now my duty to completely drain you"
["Meu dever agora é drenar você totalmente"] era o estribilho — a um só
tempo, um reconhecimento do poder que ela tinha sobre ele e uma
acusação.
Havia outras canções inspiradas por Tobi, ás vezes não muito
claramente ligadas, mas todas assombradas por seu fantasma. '"Lounge Act'
é sobre Tobi'", observa Krist. Um verso na canção se refere á tatuagem de
Kurt: "Vou deter a mim mesmo, usarei um escudo." Outra resume como a
relação foi mais de aprendizagem do que de amor: "We've made a pact to
learn from whoever we want wthout new rules" ["fizemos um pacto para
aprender com quem quer que quiséssemos sem novas regras"]. Em uma letra
anterior, não gravada, de "Lounge Act, Kurt se dirigia mais diretamente a
sua ex-amante; "I hate you because you are so much like me" ["Eu te odeio
porque você é muito parecida comigo"]. "Lithium" foi composta antes de Tobi,
mas com o tempo a letra mudou e no final a retratava.
Mais tarde, Kurt contou a Chris Morris, da revista Musician, que a
canção incluía "Parte das minhas experiências pessoais, como terminar com
namoradas e ter relacionamentos ruins, sentir aquele vazio de morte que a
pessoa na canção está sentindo — muito solitária, doente".
Embora Kurt nunca o mencionasse especificamente, sua canção
mais famosa, "Smells Like teen Spirit", não pode ter sido sobre ninguém
mais, com a letra que dizia; "She's over-bored and self-assured" ["Ela é
superentediada e autoconfiante"]. "Teen Spirit" era uma canção influenciada
por muitas coisas — sua raiva dos pais, seu tédio, seu eterno cinismo —,
embora vários versos isolados ecoem a presença de Tobi. Ele compôs a
canção logo após a separação, e a primeira versão incluía um verso
eliminado da versão final; "Who will be the king and queen of the outcast
teens?" ["Quem será o rei e a rainha dos adolescentes abandonados?"]. A
resposta, em algum momento da sua imaginação, tinha sido Kurt Cobain e
Tobi Vail. Suas canções eram o aspecto mais produtivo da separação; seus
escritos e trabalhos artísticos mostravam um resultado mais enraivecido e
patológico.
Um desenho mostra um alienígena com a pele sendo lentamente
arrancada: outro, uma mulher com um chapéu da Ku klux Klan ergue a saia
e exibe a vagina; outro desenho retrata um homem esfaqueando uma mulher
com seu pênis; e outro, ainda, mostra um homem e uma mulher fazendo
sexo, tendo abaixo a legenda: "Estupra, estupra". Havia dezenas dessas
representações e páginas e páginas de histórias com finais trágicos e
imagens perturbadoras.
Não é rara a seguinte ladainha:
Quando eu crescer, quero ser bicha, negro, cadela, puta, judeu,
chicano, chucrute, carcamano, maricas, hippie branquelo, ganancioso,
acumulador, saudável, suado, peludo, másculo, new waver excêntrico,
direitista, esquerdista, milico condecorado, cagão, campeão, estúpido, físico
nuclear, conselheiro do AA, psiquiatra, jornalista, punho fedido, romancista,
gay, preto, aleijado, drogado, HIV positivo, hermafrodita, filhote de golfinho,
obeso, anoréxico, rei, rainha, agiota, corretor de ações, maconheiro,
jornalista (tudo é inflado, menos é mais. Deus é gay, fisgar uma presa),
jornalista de rock, zangado, rabugento, de meia-idade, amargo, pequeno,
magricelo, dogmático, velho, agente contratador e ditador de um fanzine que
extrai o pequeno percentual até do menor percentual. Mantê-los dividido,
formar guetos, unidos ficaremos, não respeitar as sensibilidades dos outros.
Mate-se mate mate mate mate mate mate mate estupro estupro estupro
estupro é bom, estupro é bom, estupro mate estupro ganância ganância bom
ganância bom estupro sim mate.
A maior parte da raiva, porém, era voltada para dentro. Se havia
um tema central nesta escrita naquele outono, era o auto-desprezo. Ele se
imaginava como "mau", "defeituoso", "Doente". Uma página relatava um
conto maluco — completamente fantasioso — de como ele gostava de chutar
as pernas de mulheres idosas porque "esses tornozelos têm uma garrafa
plástica cheia de urina afivelada nelas e um tubo que vai para dentro da
velha vagina musculosa esgotada; a nódoa amarela sai voando para toda
parte". Em seguida, ele procurava "bichas de cinqüenta anos de idade que
possuem o mesmo mau funcionamento, mas em uma cavidade diferente [...]
eu chuto sua cueca de borracha e a coisa marrom vaza para a calça bege".
Mas esta história perturbadora acabava fazendo a violência voltar para o
narrador; "Então, as pessoas sem nenhum fetiche especifico me chutam o
corpo inteiro e a cabeça e observam a merda vermelha esborrifar e correr e
ensopar meus jeans azul e camisa branca". O conto terminava com ele
escrevendo repetidamente "Eu sou mau", e então, vinte vezes em grandes
caracteres, do tamanho das letras que ele usava para pichar nas paredes de
Aberdeen, "EU, EU, EU", até que finalmente ficava sem espaço, tendo
enchido cada centímetro da página. Escreveu isso com tanta força que a
caneta atravessou o papel. Ele não fazia nenhum esforço para ocultar essas
histórias, muito pelo contrário, seus diários jaziam abertos pelo
apartamento. Jennifer Finch começou a namorar Grohl e leu alguns dos
escritos deixados na mesa da cozinha, e percebeu o tormento de Kurt.
"Fiquei preocupada com Kurt", lembra ela. "Ele estava fora de controle."
O ódio que ele tinha pelos outros era leve comprado á violência que
traçava contra si mesmo. O suicídio surgia repetidamente como tópico. Uma
invectiva detalhada como ele era capaz de se transformar em "Helen Keller,
perfurando minhas orelhas com uma faca, depois cortando fora minha
laringe". Ele reiteradamente fantasiava o céu e o inferno , tanto abraçando a
idéia de espiritualidade como uma fuga após a morte, mas com igual
freqüência a rejeitando com toda a convicção. "Se você quiser saber como é a
vida após a morte", especulava ele, "vista um pára-quedas, suba num avião,
injete uma boa quantidade de heroína nas veias e imediatamente uma dose
de óxido nitroso, e depois salte ou ateie fogo a si mesmo."
Na segunda semana de novembro de 1990, um novo personagem
começara a nascer na escrita de seus diários, e essa figura logo passaria a
entrar em quase toda imagem, canção ou história. Ele intencionalmente
grafava o nome errado, e, ao assim fazer, estava lhe garantindo uma vida
própria. Estranhamente, deu a ela uma personalidade feminina, mas já que
ela se tornou seu grande amor naquele outono — e até o fazia vomitar, tal
como Tobi —, havia justiça nessa opção pelo gênero. Ele a chamou de
"heroína".

Where did you sleep last night